domingo, 9 de agosto de 2015

A Colmeia - Parte III

A Abelha Rainha.

"Não se pode sentir o calor ou frio de alguém estando dentro desta prisão.
  O ferrão de uma Vespa é extensão de seu coração; mas de que adianta mostrar-lhe uma parte se realmente quero entregá-lo todo a ele ? O essencial de manter-se vivo fora da Colmeia é manter acesa a chama já fraca da humanidade nesse perverso e abandonado resto de mundo, mas confesso que a única coisa que mantém a minha chama ainda acesa é o olhar ligeiro e fulminante dele. Ah, o que meu silêncio lhe contaria se falássemos a mesma língua, Isaac.
  A tempestade se aproxima, e espero que o caos das chuvas e ventanias me guie para fora deste fardo sem escapatória."

Aurora.

"A conexão com a antiga vida fora partida; refazer pedra por pedra a grande muro da humanidade é o único recurso disponível.
  Isaac, Prof. Tylor e Aurora caminhavam ligeiramente pelos canais subterrâneos da Colmeia. Isaac não perguntava tanto quanto o professor, mas sempre que podia tentava o contato visual com a Vespa; e sempre recebia nada além de uma expressão sólida e imóvel.
  As Vespas possuíam uma motivação cultural oposta à dos habitantes da Colmeia : Nasciam e morriam jurando à seu ferrão e dedicavam-se a proteger uns aos outros, além de trazer pessoas de dentro da Colmeia para a colônia.
  Se na Colmeia as razões humanas já eram então preservadas, por que fugir ?
Aurora, pacientemente, falou sobre o grande mal. Não conseguia explicar o que era nem como se manifestava, deixando ainda mais questões que se reproduziam febrilmente pela língua do professor, mas morriam singelamente na cabeça de Isaac.
  Antes da próxima pergunta ser proferida à já impaciente moça, ela anunciou que chegaram a colônia. Versou sobre regras de comportamento e sinais que deveriam ser feitos ou evitados.Enquanto falava e subia pela tampa do bueiro, não prestava atenção na colônia à frente. Quando virou-se para ver seu lar, ergueu-se e correu em disparada pela campina, seguida lentamente pelos rapazes.
  As casas de material quebradiço possuíam um certo ar rústico , embora bem polido ; formando um contraste peculiar. A harmonia das Vespas circulando livres pelo dia ensolarado; com gritos saindo de feiras, choros de crianças mimadas, brigas e risadas histéricas enchiam a memória de Aurora...E foi apenas o que lhe sobrou; pois o incêndio geral em uma das últimas colônias de Vespa harmonizava pacificamente com o crepúsculo de pano de fundo.
  Corpos carbonizados ainda abrasados, choupanas que viraram cinzas e um espírito geral alquebrado. Um berro de Aurora irrompe como um relâmpago; em dia de sol. Seu berro abafara os pedidos de socorro vindos de trás. O luto já era forte e agora estava acompanhado de desespero ante a morte.
  O professor corria em direção a Aurora, suado e com um Zangão em seu encalço. Em uma demostração ao limite da agilidade, Aurora punha a máscara e, em fração de segundos seu ferrão estava totalmente transpassado ao corpo fino do Zangão. Mel escorreu pela lataria da machina e então esta desabou. Atordoado,Tylor possuía apenas um campo de visão , mas três focos : O primeiro Zangão que vira destruído, a ofegante Vespa...E a visão que arrebatou o olhar de ambos : Isaac de joelhos com uma lança enterrada em seu abdômen. O mais aterrador era quem segurava a ponta da lança : A própria Queen Bee.

   Uma tempestade se aproximava da Colmeia; podia ser vista da capina em que estavam; e os trovões anunciavam em coro que aquela que viria não possuía nada de natural. Sentia-se um medo geral estranho, mas Aurora sabia o que viria e o que estava buscando.

  Queen Bee não carregava qualquer expressão em seu semblante, apenas olhares mecânicos um pouco mais suaves que os dos Zangões. A abelha rainha encarava friamente Prof. Tylor e Aurora, como se esperasse algo deles; mas a paralisia pela consecutividade de eventos estava os tomando e desenvolvendo um princípio de loucura. A perfeita cidade começava a parecer desmoronar para Tylor,
   A rainha moveu o braço esquerdo para a altura do rosto; fechou os dedos com a mão ainda espalmada e torceu o antebraço para frente, seguindo de um ranger metálico. A tempestade começa a vir ainda mais rapidamente para a Colmeia, como atraída pelo sinistro movimento de Queen Bee.
  A máscara de Aurora cai e seu rosto demonstra um misto de medo e perplexidade.

A placa, as machina, a tempestade, Queen Bee. Os traços do destino começam a se esticar."

Continua...

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