domingo, 26 de julho de 2015

Nightingale.

"I
 A lua púrpura é o coração da Espanha nas noites de festa.
 As danças corpo a corpo formam, todas juntas, um ritmo de harmônica inconstância como sangue quente correndo pelas veias de toda Andaluzia.
 Fortes são as pulsações desse sangue flamenco que se passam de dança em dança; lábio em lábio; e sem ceder a qualquer encanto mantinham-se imaculados os lábios da pequena Rouxinol; de traços corporais suaves e praticamente feitos para flamenco, merengue ou salsa. Essa pequena rouxinol está sempre em todas as pulsações espanholas e acelera e aquece ainda mais o sangue das ruas e dos homens que são honrados com uma dança.
 Só aparece pelas frestas noite, a Rouxinol; e com um ritmo acelerado, tanto de coração quanto de ginga. Porta sempre uma curiosa máscara que combina estranhamente com seu feitio encantador e livre de um preconceito tão efêmero quanto a aparência.
 Curioso apelido, já que se vale dança e ainda assim é chamada por um pássaro famoso pela voz. Dize-se que quem assim a chamou pela primeira vez fora o único ou única que tenha ouvido a voz ou despido sua máscara. Tamanha honra é dar-se sem máscara à pessoa que a merece, pois não cabem mais julgamentos depois que a própria doçura em si seja a única imagem que se tem desse alguém.

II
 Os sonhos saem pelas varandas e ricocheteiam nas ligeiras palhetadas da guitarras que animam o festival; espalham-se e apaixonam-se pelos suspiros que se escondem nas gargantas e são disfarçados pela dança.
 Porém um disfarce chama sempre mais atenção que os outros : Uma máscara cromada e adornada por um perfeito entalhe de rosa atravessado pela expressão fria do objeto toma a cena e contrasta com o curto vestido preto e vermelho que se move e balança hipnoticamente, traçada perfeitamente a silhueta do quadril da Rouxinol e embalada em forma de pintura pela acelerada guitarra.
 Entrava em meio a todos dançando sozinha e atirada em direção ao nada, mas sempre sustentada pelos olhares de desprezo ou paixão severa, e seguia a assim a noite, de braço em braço, dança em dança; mas sem desferir um beijo, palavra ou expressão sequer. O rosto e a boca tapados pela máscara e a garganta tapada pelo mistério quase erótico.
 Como quem apanha um beijo no ar, um jovem apanhou esse mistério e com olhar semicerrado dançou em direção ao Rouxinol; como se entendesse que podia ele desvendar aquela história se erguendo a passos...calientes.

III
 A Rouxinol sem voz some em meio às pulsações da cidade e o jovem fracassa em achá-la.
 Lamenta pela manhã não lhe ter perguntado o nome ou qualquer coisa; pois ficara bestificado com os movimentos ligeiros energizados por ritmo rápido.
 Esse ritmo rápido a atrai como formigas ao doce e como as sombras ganham vida na própria luz; esta misteriosa luz obscura ganha vida nas sombras da noite, e dos becos e festas por toda a Andaluzia passa a mascarada em busca de dança.
Festa por festa, dança por dança, nota por nota.
Eternamente.
Febre passageira, espírito do simplicidade e beleza que lutam contra a gaiola para que se aconchegue no seio da felicidade qualquer povo que não mereça sofrimento.

Nenhum comentário:

Postar um comentário