sábado, 4 de julho de 2015

A Razão da Justiça.

"Era uma nação muito engraçada,
 Só tinha um Rei, que sábio de berço
 Devia sempre ser, não por família,
 Mas por escolha de um Destino fanfarrão.

 A cidade crescia mais e mais
 Em torno dos três Centuriões de Ouro,
 Que informavam a decisão do universo
 Para o pequeno povo.

 Não tinham rostos, os monólitos dourados;
 Somente um espaço para as palavras.
 Uma de cada vez e as três juntas.
 Do rosto de cada Centurião, o veredicto
 Da boca de cada Rei, a interpretação.

 Rei Edvardo, desde pequeno criado para ser Rei,
 Livros de legislação e filosofia ainda muito jovem
 Estudos ao invés de anedotas,
 Tirou-se o açúcar da infância
 E se acrescentou a gosto o ferro das leis.
 A receita correta para servir um tirano à moda.

 Os centuriões se levantam da pose estática
 E põe-se de pé a anunciar as palavras já escolhidas,
 Por ninguém sabe quem, mas precisamente
 Como o carrasco ao réu.
 Nos visores dos capacetes das estátuas vivas aparece :
 JORQUÈ - VIRGO - MORTEM

 A Ágora estava em pânico.
 As três palavras pareciam centenas,
 Pois pareciam detalhar cada condição
 Do que seria uma sentença final.

 "O Cavaleiro escuro, Jorqué.
 Aparece sob a constelação de Virgem,
 Semeia horror como quer,
 As mulheres morrem de vertigem,
 As crianças morrem de pé."

 Assim era um poema popular daquele povo,
 Que não apreciava cantigas de amor,
 Só lamentos de almas perdidas
 E choros de almas banhadas em dor.

 O Rei chegou ao seu ápice,
 Filosofou e maturou a resposta celestial:
 Exigiu as virgens da cidade
 Para completar o ritual,
 Ritual de libertação de seu povo,
 Com a bênção do Universo,
 Que, como dizia o sábio Rei;
 Clama seu sacrifício carnal.

 O povo entregou ,sem demora, as humildes jovens,
 Nunca prontas ao destino injusto;
 E trancafiadas foram
 Nos aposentos do Rei.

 Na noite do sacrifício, uma confissão dura :
 Rei Edvardo e uma das jovens, Temys, a cega; estão apaixonados,
 Deitaram-se pela manhã
 E arrependeram-se quando viram o fatal presságio,
 Do reflexo das chamas da fogueira nas armaduras dos Centuriões.
 O inferno viria da justiça imparcial, pensara Edvardo.
 E estava certo, o monarca.

 O dia seguinte se deu com o sofrido povo castigando
 Não o promíscuo e irresponsável Rei,
 Mas atirando pedras na jovem que ia ser sacrificada,
 Troçando-a como 'prostituta cega'.
 O povo tomava aquele ato de ódio
 Contra uma deficiente e adolescente menina,
 Por que dizem que prender o ódio faz mal ao coração,
 Mas descarregá-lo no Rei
 Faz mal aos bolsos.

Noites belas costumam ser também, artistas;
E aquela noite decidiu desenhar
Traços de Cavaleiro Negro.
 Jorquè entrou sorrateiro na cidade e seu diabólico corsel
 Cavalgava cidatela adentro,
 Com seu jóquei despedaçando pelas ruas
 Tudo que era vivo e de carne,
 Pintando os muros e estradas
 De vermelho.

 Corpos de homens, mulheres e crianças
 Se misturavam aos pedaços no chão;
 Os que sobreviviam se escondiam em abrigos subterrâneos
 E clamavam a qualquer coisa que pudesse ouvir
 Que a noite acabasse de vez.

 O cavaleiro e seu cavalo iam a trote procurando
 Pelo resto de cidadãos que ainda vivessem,
 Pois a sede de sangue desse demônio encarnado
 Ainda estava começando.
 E fora atiçada quando vira na Ágora,
 Uma figura encapuzada se postava de pé,
 Quase como desafiando Jorquè.

 O Diabo de malha preta botou o cavalo a galope rápido,
 Reto em direção à vítima.
 Ia implacável e quase desesperado.

 A figura de capuz sacou uma singular espada,
 De forma ligeira passou a lâmina no torso do cavaleiro,
 No exato momento em que este estava com sua espada no alto,
 Passando a galope.

 O povo, incrédulo chegava perto do corpo partido do cavaleiro,
 E depois olhara para seu benfeitor, que permanecia parada
 No mesmo lugar, com a espada abaixada,

 A incredulidade tomava conta daquela gente,
 Não pela morte do Diabo,
 Mas por terem sidos salvos
 Por uma prostituta cega,"




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